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Nos últimos dias temos visto uma verdadeira disputa de posicionamentos entre o governador do Estado de Goiás e o presidente da República, os quais têm divergido sobre as melhores medidas de enfrentamento da pandemia advinda pelo COVID-19, que assola não apenas o Brasil, mas todo o globo.

O combate à pandemia instaurada apresenta diversos pontos de vista divergentes, nas variadas searas, sejam jurídicas, saúde, gestão, política, dentre outras. Todavia, independente da natureza da atividade, encontramos dois pontos que, a priori, são divergentes, mas provavelmente convergirão em um futuro próximo e, por isso, vale a análise.

Diante do cenário de rápido alastramento do COVID-19, o governador do Estado de Goiás, o qual é de amplo conhecimento é médico por formação, tem sido enérgico na gestão deste Estado e determinou por meio de uma série de decretos a suspensão de diversas atividades.

Inicialmente decretou a suspensão de atividades de bares, restaurantes, casas noturnas e afins, sendo que no último dia 26/03/2020 houve a determinação de suspensão de todas as demais atividades não essenciais.

Noutro ponto, o presidente da República, por meio de pronunciamento à nação, dispôs em linhas gerais que as atividades não podem ser paralisadas, de modo que as pessoas têm de continuar com suas rotinas de trabalho normais.

Instaurado o conflito entre o médico profissional, ora gestor do Estado de Goiás, e o presidente da República, militar reformado e “ex-atleta”, tem sido suscitado por alguns juristas a aplicação do disposto no art. 486 da CLT[1], cumulado com o disposto no capítulo VIII – Da Força Maior, também do mesmo diploma legal.

Ora, a aplicação deste preceito legal, também conhecida como factum principis, deve ser analisada não apenas no que diz respeito à letra da lei, mas também de acordo com a jurisprudência dos Tribunais pátrios, assim como diante do cenário global da doença que assusta a todos(as).

Jurisprudência esta que, além de analisar os casos de forma pontual, tem sinalizado ao longo dos anos certo protecionismo estatal. Primeiro pelo âmbito de proteger o Estado de uma possível responsabilização desenfreada em razão de atos necessários pelo próprio ente estatal, alguns decorrentes do poder de polícia. 

Lado outro, sob o ponto de vista financeiro, a aplicação do aludido preceito poderá gerar uma derrocada (derrota) dos entes estatais, que por ventura tenham determinado a suspensão ou paralisação de diversos setores da economia.

Assim, a “independência do meia-ponte” – piada que circula nas redes sociais – apesar de ser tratada como uma “vitória” política por parte do governador de Goiás, pode reverter contra o próprio Estado, seja sob a ótica da aplicação do fato do príncipe, seja quanto à ruptura entre o governo federal com o Estado de Goiás, situação que somente torna mais complexa a questão das empresas do Estado de Goiás, as quais encontram-se TOTALMENTE À MERCÊ da administração pública, assim como sob o ponto de vista dos milhões de trabalhadores.

Por fim, curial salientar que o fato do príncipe não se trata de simples solicitação feita ao ente estatal, mas sim de defesa processual por parte do empregador, de modo que deve-se analisar que até o ajuizamento de qualquer processo e defesa por parte do empregador, o trabalhador encontrar-se-á desempregado e a empresa em sérias dificuldades financeiras. 

Portanto, deve-se analisar o atual momento, assim como medidas para que se proteja aqueles que empregam e aqueles que precisam do trabalho e se deixar um pouco de lado a briga política por si, pois creio que os salários de nossos políticos estejam todos devidamente em dia.


[1] Art. 486 – No caso de paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável.                     

§ 1º – Sempre que o empregador invocar em sua defesa o preceito do presente artigo, o tribunal do trabalho competente notificará a pessoa de direito público apontada como responsável pela paralisação do trabalho, para que, no prazo de 30 (trinta) dias, alegue o que entender devido, passando a figurar no processo como chamada à autoria.        

§ 2º – Sempre que a parte interessada, firmada em documento hábil, invocar defesa baseada na disposição deste artigo e indicar qual o juiz competente, será ouvida a parte contrária, para, dentro de 3 (três) dias, falar sobre essa alegação.

§ 3º – Verificada qual a autoridade responsável, a Junta de Conciliação ou Juiz dar-se-á por incompetente, remetendo os autos ao Juiz Privativo da Fazenda, perante o qual correrá o feito nos termos previstos no processo comum.

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